Um tsunami coloca dois jovens isolados em uma ilha. Diante deles, somente o outro e um universo que se desdobra em imagens impressionantes, fantásticas. Entre eles, o desejo – e um desejo que se materializa poeticamente em imagens perturbadoras como balas de revolver suavemente lançada por entre os lábios e uma granada que entope o sexo e explode – e uma disputa.
Aos poucos, o dissabor que se instaura nesta zona de conflito envolve, também, a plateia e, depois, dissipa-se. O rapaz sai para enfrentar uma terrível, enorme serpente que ameaça a ilha enquanto ela o assiste. Depois, ela relembra os preparativos para uma grande festa que marcou sua adolescência. Depois, o desejo volta a se instaurar entre eles. Depois, surge um unicórnio e assim, sucessivamente, vão se repetindo, como que em um caleidoscópio, imagens, memórias, aspirações, culpas e desejos na voz de dois jovens aprisionados em um cenário idílico, lançados ali depois de um cataclismo inicial. No caso, um trauma que vai se descortinando lentamente, revelando o drama de um casal em um momento extremo de suas vidas, aquele em que o amor acaba e a vida a dois se torna uma disputa pela sobrevivência.
É deste lugar insólito, no qual o amor, inevitavelmente, pode aprisionar duas pessoas, que surge Suave Napalm, peça do polêmico escritor e dramaturgo inglês Philip Ridley que ganhou versão nacional pelas mãos do ator e produtor Gustavo Lorenzo. Impactante, a montagem, dirigida pelo cineasta paulista Paulo Barros, economiza nos efeitos de luz e som e se concentra na atuação dos seus dois atores (Lorenzo e Guenia Lemos), que se movimentam, constantemente, no palco transversal enquanto dão vida às histórias, fantasias e desejos dos dois personagens.
Um dos méritos no texto é a sugestão. Não há nada, visualmente, gráfico na peça. Ela se constrói por meio da linguagem, verbal ou corporal, e adquire contornos, ora explosivo e castrador, ora suave e, até mesmo, engraçado, conforme se desenrola o embate entre o casal. Por vezes, o texto acaba se tornando lento e cansativo; por vezes, a carga explosiva em cena perde forças; por vezes, o desejo não se evidencia tão sensual quanto poderia. Porém, isso não compromete o espetáculo que, no fim das contas, é cativante e intenso. Incendiário mesmo, em referência ao próprio napalm, substância usada nos lança-chamas. Em muitos sentidos. |