A nova produção da cultuada companhia curitibana Vigor Mortis, Marlon Brando, Whiskey, Zumbis e Outros Apocalipses, tira bom proveito do espaço alternativo escolhido: o barracão da Sociedade Vasco da Gama, onde o grupo simula um bar abandonado, com cenário surpreendente de Guenia Lemos. Aos primeiros acordes da trilha roqueira a cargo do diretor Paulo Biscaia Filho, dezenas de orifícios nas paredes projetam feixes de luz multidirecionais que preenchem o local e fazem uma típica abertura “vigoriana”, repleta de elementos multimídia.
Os três protagonistas, Boris (Andrew Knoll), Bella (Michelle Rodrigues) e Elsa (Carolina Fauquemont) contracenam tanto com imagens projetadas – outra marca da trupe – quanto com zumbis, bem caracterizados pelo figurinista Paulo Vinícius e cujos movimentos foram treinados por um especialista em artes marciais, o norte-americano Daniel Bakken.
Na história, após os personagens perceberem ser os únicos humanos vivos no mundo, dão uma pausa na luta pela sobrevivência (o combate contra os zumbis sempre acaba com a eliminação do morto-vivo, mas dá trabalho) e passam a fazer a matemática de suas diferenças. Aqui o texto de Biscaia brinda o espectador com boas tiradas: o intelectual vaidoso, que “só não terminou o doutorado porque o mundo acabou”, confronta-se com a praticidade da skatista de bairro, que não dá a mínima por ter aplacado a fome com um dos últimos micos-leões-dourados do planeta.
A presença das artes em citações irônicas, tanto sobre obras de arte anteriores quanto sobre sua filosofia é farta, permitindo várias leituras sobre o que zumbis, fim de mundo e relacionamentos querem dizer naquele contexto.
Quanto à atuação, essa é uma peça de muito movimento pelo palco, com direito a vários “modais” de transporte e coreografia de combate. Em meio a esse delicado agito, é bom observar o amadurecimento da atriz Michelle Rodrigues desde sua participação em Satyricon Delírio, em 2012. Andrew Knoll (ator do curta-metragem A Fábrica, que, no ano passado, alcançou as semifinais do Oscar) acrescenta neste trabalho sutilezas cômicas ao tom canastrão proposital e típico das peças da companhia.
Entre os motivos para comemorar, está a marca de assinatura da Vigor que se faz ver em mais um espetáculo. |