Usando as ilustrações de Dave McKean para o livro THE WOLVES IN THE WALLS como inspiração, o cenário foi desenvolvido focando nas texturas, nas linhas angulares e na bidimensionalidade. Mudanças no plano de visão são proporcionadas em determinados momentos com cama e assoalho que ficam perpendiculares ao chão.
 
     
     
 
Texto Original Neil Gaiman THE WOLVES IN THE WALLS
Dramaturgia Paulo Biscaia Filho
Direção Paulo Biscaia Filho
Elenco Guenia Lemos, Lucas Ribas, Luiz Bertazzo, Michelle Rodrigues,
  Renato Sbardelotto & Uyara Torrente
Direção de Produção Marco Novack
Assistência de Produção Luiza Azevedo
Assistência de Direção Angela Stadler
Preparação Corporal Eliane Campelli
Iluminação Wagner Corrêa
Operação de Luz Semy Monastier
Figurino Paulo Vinícius
Costureira Perpétua Guedes
Cenário Guenia Lemos
Cenotécnico Samuel Amorim
Adereços e Cabeças dos Lobos Michelle Rodrigues & Diego Perin
Direção Musical & Sonoplastia Demian Garcia & Denis Nunes
Músicos Demian Garcia & Denis Nunes
Músico Substituto Felipe Ayres
Fotos Marco Novack
Maquiagem Isabella Japiassú
Vídeos Paulo Biscaia Filho
Operação de Vídeos Angela Stadler
Realização Vigor Mortis
   
LOBOS NAS PAREDES estreou no Teatro Guairinha, Curitiba, em 2015.
 
         
           
 
GAZETA DO POVO
Uyara Torrente vive menina com rinite que conquista a gente
“Lobos nas Paredes”, de Paulo Biscaia Filho, encena o quadrinho de Neil Gaiman com bons atores
Helena Carnieri
 

Em sua primeira investida infantil, o diretor Paulo Biscaia Filho trouxe ao palco a força de bons atores, que falam de um jeito coloquial e evitam chavões da linguagem para crianças em “Lobos nas Paredes”.

Com habilidade, o grupo sugere o suspense que perpassa a obra homônima do quadrinista Neil Gaiman (de “Sandman”), mas não a ponto de mandar as crianças com medo para a cama.

Por outro lado, a ausência de sangue cênico parece ter tirado um pouco do vigor do “corvo curitibano” – sente-se falta de um rigor coreográfico, uma precisão de movimentos em que o teatro infantil se esmera. Por exemplo, os lobos são fofíssimos, até conseguem grunhir falas em sua performance, mas poderiam ganhar com uma direção de corpo mais aprofundada.

Os quadrinhos foram transpostos para um cenário inteligente (assinado por Guenia Lemos, que também faz a mãe da família retratada), que tem opções interessantes como a fachada da casa, a esteira em que a protagonista caminha, as paredes móveis da residência e a cama vertical. No primeiro plano, na borda do palco, temos o exterior da casa de Lucy, nossa heroína com rinite. No centro e fundo do palco, acompanhamos o desenrolar da história.

Lucy é uma menina entediada, muito bem representada por Uyara Torrente com o tique de coçar o nariz. Bem insegura, bem infantil, a heroína juvenil que logo nos conquista. A atriz, também vocalista da Banda Mais Bonita da Cidade, canta só uma vez, e é muito bom vê-la usar a voz mantendo sua personagem, dando ao canto os tons que Lucy teria. Pena que é uma canção só.

Em vão Lucy tenta chamar a atenção de pai, mãe e do irmão pré-adolescentemente abobado. É triste ver uma família que não se comunica. Mas ela consegue unir o grupo, ainda que por um curto tempo, quando lidera a retomada da casa, invadida por lobos que “saíram das paredes”.

Com relação ao tema metafórico, é interessante que Biscaia tenha optado por não politizar o subtexto, não colocar palavras naquela poesia que paira no ar. Quem sãos os lobos e o que são as paredes, fica para quem quiser imaginar.

Marca registrada da companhia Vigor Mortis, as projeções também encontraram lugar na peça, com uma divertida brincadeira sobre a personalidade do pai.

Em tempo, é curioso como o público sai de adaptações comentando a tal “fidelidade” ao texto original. Apesar de trazer o mesmo nome, a versão de Biscaia para o palco é uma nova obra, com nova assinatura – não é sua obediência aos quadrinhos que traz qualidade ao trabalho, e sim o fato de usar sua própria criação a partir da imaginação de Gaiman.

 
 
 
A ESCOTILHA
Lobos nas Paredes faz metáfora de nossos medos
Aline Vaz
 

Sem sangue escorrendo pelo palco, a Companhia Vigor Mortis investe em uma nova abordagem do horror. Em Lobos nas Paredes, com texto e direção de Paulo Biscaia Filho, a partir da obra de Neil Gaiman, vemos a metáfora do horror para todas as idades. Assistindo ao espetáculo, entre adultos e crianças, questionei se a peça não era muito forte para o público infantil e encontrei a resposta: para elas, são apenas lobos, e não outras ameaças. Como eu queria ter medo apenas dos lobos!

Logo no início já sentimos o primeiro sintoma do horror que nos persegue. A menina Lucy (Uyara Torrente) não estava sozinha, mas era como se estivesse. Vestindo uma blusa com listras brancas e vermelhas, lembrando o personagem Wally, encontra-se perdida na casa entre a família. Quantas vezes estamos acompanhados e ficamos assustados com aquele barulho emitido ao nosso redor? Para que possa criar uma relação com os barulhos estranhos, a menina estranha, mas esperta, estranha, mas sensível, nomeia com adjetivos os sons inexplicáveis. A semântica explica que nomeamos coisas do mundo dito real ou de algum mundo que talvez não conheçamos, mas que poderia existir, para que possamos nos identificar com alguma representação mental – criamos conceitos. O barulho dos lobos nas paredes é circunspecto, patusco, farfalhante, crepitante, furtivo, rastejante, amarrotado… Palavras que não são conhecidas no vocabulário do cotidiano infantil, mas que ao criar um código linguístico é possível criar representações para as novas palavras. Cada espectador cria o seu conceito para o barulho circunspecto, patusco, farfalhante, crepitante, furtivo, rastejante e amarrotado.

Os lobos nas paredes podem representar opressão, exílio, violência… Eu escolhi o medo. Lucy vive em uma família em que o irmão só joga videogame e não quer papo com a irmã, a mãe preocupa-se com as geleias e o pai conversa com a filha sem nunca olhar para ela. Sozinha, Lucy precisa enfrentar o medo, avisar a família que algo desconhecido e assustador está por perto. O medo existe quando damos ouvido a ele. A família tenta ignorar, porque quando os lobos saem das paredes tudo está acabado. E eles saem. A primeira atitude é fugir da casa. Depois é preciso voltar e enfrentá-los. Quem nunca deixou seus monstros fugirem e depois precisou enfrentá-los? E depois de vencer os seus monstros outros virão. É preciso estar atento aos barulhos, saber nomeá-los e expulsá-los.

A música do porquinho cativa com o refrão interpretado por Uyara Torrente: “Levanto um muro alto pra nada disso passar; com mais de cem mil metros para nada te machucar”. Às vezes é preciso derrubar os muros, enfrentar o perigo do lado de lá e sair de nossas paredes.